A Jornada Mundial da Juventude foi um verdadeiro acontecimento, com repercussões tão amplas e profundas que surpreenderam a muitos. O jornal O Globo intitulou o caderno dedicado à JMJ: “Um dia de graça”. Os três milhões e meio de jovens que estavam na Missa de encerramento experimentaram a intensidade e a profundidade dessa graça que se tornava visível nos olhos cheios de lágrimas e na comoção que tomava conta de cada um, especialmente quando o Papa Francisco tocava com suas palavras e atitudes pontos delicados do coração das pessoas. Os milhões de pessoas que acompanharam através dos canais de televisão tiveram experiências semelhantes. De fato, nos dias seguintes, nas famílias, nas escolas, nas empresas, parecia não haver outro assunto do qual conversar em clima de satisfação, mesmo por parte de quem há muito tempo não frequenta a Igreja Católica.

Os jovens vieram de 170 países, mas a grande maioria veio de todos os cantos do Brasil e fizeram grandes sacrifícios para chegar ao Rio, onde a programação de cada dia exigia muito de cada um deles. Os vimos cantando nas longas filas do metrô, vimos jovens alegres, pacientes, comovidos, agradecidos, entusiasmados e com saudades já ao iniciar a viagem de volta. Não é difícil reconhecer um autêntico milagre que mostra o quanto a Igreja está viva. Eu vi não somente a multidão de católicos alegrar-se com a JMJ, mas pastores evangélicos, filhos de santo, ateus de carteirinha. Poucos foram os que lastimaram essa beleza que se desdobrava dia a dia diante dos nossos olhos na praia de Copacabana, nas avenidas do Rio e nos lugares onde os jovens se concentravam. Um grande jornal paulista optou por não informar seus leitores a respeito do que estava acontecendo no Rio com a presença do Papa, dando, em lugar dos fatos, suas interpretações a respeito da religião no Brasil, analisando a diminuição do número de católicos e descrevendo (desejando ou talvez recomendando) o distanciamento dos jovens das recomendações do Papa Francisco! Faltou informar com inteligência os fatos que estavam acontecendo, prevaleceu postura defensiva.

dom petrini e os jovens

“Continuem a vencer a apatia, dando uma resposta cristã às inquietações sociais e políticas que estão surgindo em várias partes do mundo”, disse o Papa Francisco na vigília de oração com os jovens. E distanciando-se totalmente de posturas ideológicas que só reclamam dos outros e esperam que eles mudem o andamento das coisas, o Papa acrescentou: “Por onde começamos? Por ti e por mim!” De fato, a força que pode mudar o mundo é a mesma que pode mudar o nosso coração, é a potência de Cristo ressuscitado que se doa a nós, ilumina a inteligência, fortalece o ânimo, comunica sabedoria de quem o ama e o segue. Começando “por ti e por mim”, cada um se coloca em jogo em primeira pessoa, esta é a verdadeira revolução pela qual muda o eu de cada um. Já vimos o caminho da ideologia que aposta no poder: tomando o poder, mudamos as estruturas etc. e tal. Como a mudança não alcançou o coração, ela limitou-se ao discurso e a algumas leis, nem sempre boas e, pelo resto, tudo ficou igual! A revolução que envolve o eu dribla a armadilha da pura reivindicação que espera a iniciativa de outros para que algo melhore neste mundo. “Tornamo-nos construtores da Igreja e protagonistas da história. (…) Sejam protagonistas. Joguem ao ataque! Chutem para diante, construam um mundo melhor, um mundo de irmãos, um mundo de amor, de justiça de paz, de fraternidade, de solidariedade”.

Nesse mesmo sentido, falando a 7 mil voluntários no Rio Centro, o Papa Francisco disse: “Deus chama para escolhas definitivas, Ele tem um projeto para cada um: descobri-lo, responder à própria vocação é caminhar para a realização feliz de si mesmo. (…) Alguns são chamados a se santificar constituindo uma família através do matrimônio. Há quem diga que hoje o casamento está ‘fora de moda’. Está fora de moda?” Não, responderam os jovens! ”Na cultura do provisório, do relativo, muitos pregam que o importante é ‘curtir’ o momento, que não vale a pena comprometer-se por toda a vida, fazer escolhas definitivas, ‘para sempre’, uma vez que não se sabe o que reserva o amanhã. Em vista disso, eu peço que vocês sejam revolucionários, eu peço que vocês vão contra a corrente; sim peço que se rebelem, que se rebelem contra esta cultura do provisório. Eu tenho confiança em vocês (….). Tenham coragem de ir contra corrente. E também tenham coragem de ser felizes”.

Agora, retornado cada um em sua casa, em sua comunidade, é importante retomar os textos do Papa Francisco para que sejam objeto de trabalho, de reflexão, de troca de experiências. Esse trabalho deveria ter três etapas:

1- A primeira tarefa é comparar as palavras do Papa com o que nós normalmente pensamos, com o que ouvimos em casa ou na escola ou na roda de amigos, com os colegas de trabalho. É importante comparar e avaliar, julgar o que vale mais porque corresponde aos anseios mais profundos do nosso coração e o que vale menos porque leva a viver imersos nas banalidades costumeiras e a nos mover num horizonte medíocre e acanhado. Trabalhando juntos, em grupo, fica mais fácil identificar o valor que pode proporcionar grandeza à nossa experiência humana.
2- Em segundo lugar, é necessária a coragem para mudar. A mudança que começa a acontecer em nós, no modo de pensar, de agir, de a gente se relacionar com os outros, nos sonhos que cultivamos para o futuro é o maior sinal de Deus que está agindo em nós. Não nos tornamos, de repente, perfeitos, mas a mudança começa a acontecer, nós nos damos conta disso e ficamos agradecidos e confiantes: Ele esta presente e nos ama. Outras pessoas percebem também e ficam admirados. É um grande sinal de que estamos no caminho certo.
3- Em terceiro lugar, é importante seguir Jesus, mas cuidado: não o que nós pensamos de Jesus, mas o modo de ser dele assim como emerge no Evangelho, seguir Jesus acompanhando o Papa Francisco, suas palavras, suas atitudes, para aprendermos dele um modo admirável de viver. Afinal de contas, é raríssimo ver uma pessoa da idade do Papa Francisco com a mesma alegria e disposição para encontrar, acolher, amar pessoas. Sem esquecer que enfrenta graves problemas. Segui-lo significa aprender algo de seu estilo, de sua positividade, procurando nos identificar com as razões profundas que o movem, bebendo à mesma fonte de vida onde ele bebe.

Dom João Carlos Petrini
Bispo da Diocese de Camaçari

LITURGIA DIÁRIA